sexta-feira, 30 de julho de 2010

Deficiências nutricionais induzidas por medicamentos

Um aspecto pouco considerado, e até mesmo desconhecido acerca dos efeitos dos medicamentos no organismo, é a capacidade que muitos possuem de produzir ou agravar deficiências nutricionais. Segundo o Ph.D Ross Pelton, autor do livro "The Nutritional Cost of Prescription Drugs", 15 das 20 drogas mais prescritas nos EUA podem induzir deficiências de um ou mais nutrientes.

Drogas comumente prescritas que podem causar deficiências nutricionais incluem:
 
  • Contraceptivos orais
  • Hormônios usados em terapia de reposição hormonal  
  • Anticonvulsivantes  
  • Antidiabéticos 
  • Antihipertensivos  
  • Antiinflammatórios (ibuprofeno, aspirina, etc)
  • Antiácidos (Bloqueadores H2 e bloq. de bomba de prótons-omeprazol, pantoprazol, etc.)  
  • Estatinas( medicamentos para controle do colesterol)
  • Betabloqueadores  
  • Fenotiazidas 
  • Antidepressivos tricíclicos 
  • Benzodiazepínicos 
  • Antibioticos
 
Como observamos, medicamentos de várias categorias e comumente prescritos podem causar alterações importantes no status nutricional dos indivíduos. Neste post abordarei as repercussões nutricionais causadas por duas categorias de drogas comumente prescritas: os contraceptivos orais e os medicamentos antidiabéticos.
 
Deficiências nutricionais causadas pelos contraceptivos orais (anticoncepcionais)
 
Foi ainda na década de 70 que a literatura científica começou a apontar as interações dos contraceptivos orais com vários nutrientes. Hoje numerosos estudos documentam o fato de que os contraceptivos orais depletam do organismo vários nutrientes como vitaminas do complexo B, Ácido Fólico, vitamina C, Magnésio, Selênio, Zinco e o aminoácido Tirosina.
 
Primeiramente vejamos os problemas de saúde associados com a redução do ácido fólico em mulheres que fazem uso de contraceptivos orais, tendo em mente que outras categorias de medicamentos que também depletam ácido fólico incluem: antiácidos, antibióticos, anticonvulsivantes, antidiabéticos orais, antiinflamatórios e aspirina.
 
Problemas de saúde associados com deficiência de ácido fólico incluem anemia, má formações fetais, displasia do colo do útero, que é uma condição pré cancerosa caracterizada por anormalidades celulares detectadas nos exames preventivos ginecológicos. Muitas mulheres com displasia do colo do útero terminam sofrendo histerectomia. Infelizmente, milhares de mulheres tem seus úteros retirados cirurgicamente a cada ano. Provavelmente, muitas destas cirurgias seriam prevenidas com um aporte adequado de ácido fólico e com a correção dos déficits nutricionais subjacentes. Outros problemas de saúde associados com a deficiência de ácido fólico incluem depressão, e provavelmente aumento do risco de câncer de mama e coloretal. A maioria dos estudos publicados mostram que a concentração de folato no plasma está inversamente associada com o risco de desenvolver câncer de mama.
 
Vitaminas do complexo B como acido Fólico, Vitamina B6 e vitamina B12 são necessárias para metabolizar o tóxico aminoácido Homocisteina. Níveis elevados de homocisteina constituem um fator de risco importante na origem da doença arterial coronariana e do infarto do miocárdio. Todas estas 3 vitaminas sofrem reduções com uso de contraceptivos orais. Portanto, mulheres que tomam contraceptivos orais por tempo prolongado podem muito bem estar aumentando o seu risco de desenvolver doença cardiovascular. A vitamina B6 também é necessária para conversão do aminoácido Triptofano em Serotonina, importante neurotransmissor cerebral. Portanto, a depleção de vitamina B6 induzida por uso de contraceptivos orais pode prejudicar a síntese de serotonina cerebral, o que pode aumentar a probabilidade desta mulher vir a apresentar um quadro depressivo. Em um estudo, um terço das mulheres tomando contraceptivos orais por 2 a 5 anos apresentaram quadro compatível com depressão. No cérebro, a serotonina sofre conversão em melatonina, que é um neurohormônio que participa no processo de indução natural do sono. Por esta razão, a deficiência de vitamina B6 causada por contraceptivos orais também aumenta a chance da mulher desenvolver insônia e outras desordens do sono.
 
Outros estudos tem apontado que o uso de contraceptivos orais também causam um significativo declínio nos níveis de vitamina C. Em um estudo, mulheres tomando tanto doses altas como doses baixas de contraceptivos foram avaliadas. Os resultados revelaram que estas mulheres tiveram uma redução de 30 a 42% nos níveis circulantes de vitamina C. Alguns dos problemas associados com deficiência de vitamina C incluem deficiência imunológica, cicatrização deficiente e sangramentos de mucosas, entre outras coisas.
 
Outros estudos também tem relatado que mulheres que fazem uso de contraceptivos orais também tem níveis menores de zinco. O zinco é um mineral indispensável para o bom funcionamento do sistema imunológico e pode aumentar a susceptibilidade do indi víduo de contrair uma infecção.
 
Contraceptivos orais também depletam Magnésio. Portanto, mulheres que fazem uso de pílulas anticoncepcionais são mais suscetíveis de se tornarem deficientes em magnésio. Deficiência de magnésio está associada a maior incidência de osteoporose, fraqueza muscular, ansiedade, insônia, e depressão, bem como problemas relacionados ao sistema cardiovascular, como arritmias cardíacas, hipertensão arterial, fenômenos tromboembólicos e aumento de riscode infarto do miocárdio.
 
No próximo post continuaremos este assunto tratando dos riscos nutricionais associados às drogas antidiabéticas o

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Intolerância a glúten: mais comum que muita gente pensa


Estou sempre batendo na mesma tecla. Muitas vezes a diferença entre saúde e doença reside em um detalhe. Simples como deixar de comer um determinado tipo de alimento e substituí-lo por outro. Segundo  o "Princípio de Pareto", muito utilizado no contexto da economia e política, 80% de nossos resultados ou efeitos advém de apenas 20% de nossas ações. Isto se aplica perfeitamente também a nossa saúde.Quando alguém descobre que é intolerante a Glúten, esta descoberta pode ser a diferença entre uma qualidade de vida ótima ou péssima.

O que é Glúten?

Glúten corresponde à fração proteica encontrada nos seguintes grãos e derivados: trigo, centeio,cevada e aveia.Quando alguém é intolerante ao glúten, o componente mais implicado no fenômeno é uma proteína chamada Gliadina. O glúten da farinha de trigo confere a este produto algumas propriedades que a tornam bastante atrativa para a indústria da panificação. As principais são a "viscoelasticidade" e "coesividade". Diferentemente do amido de milho ou de arroz, a farinha de trigo forma uma liga melhor quando misturada com água, o que permite uma melhor manipulação do produto. Quem já viu aquelas acrobacias que os pizzaiolos fazem com a massa sabem do que estou falando.
O trigo é constituido de 75% de carboidrato(amido) e 10-15% de proteina. 80% da fração proteica do trigo corresponde ao glúten. Os outros 20% que correspondem à fração proteica não glúten do trigo incluem albuminas, prolaminas e globulinas.

Intolerância ao glúten e Doença Celíaca.

Intolerância ou sensibilidade ao glúten é uma condição que resulta da incapacidade de muitos organismos em digerir adequadamente a proteina gliadina. A presença de macromoléculas de gliadina "mau digeridas" leva a processos de ativação imunológica, com formação de auto anticorpos. Neste processo, um dos alvos principais é a mucosa do intestino delgado que passa a ser agredida e e começa a sofrer alterações estruturais. A forma mais grave de intolerância ao glúten é conhecida como Doença Celíaca. Na doença Celíaca, também conhecida como "Enteropatia por Glúten" a reação auto imune desencadeada pela gliadina, provoca alteração estrutural importante da mucosa intestinal com "achatamento" das vilosidades intestinais(processo conhecido como atrofia vilosa).O intestino delgado humano possui aproximadamente entre 3 a 8 metro de extensão. São estas vilosidades da mucosa intestinal que permitem um incremento extraordinário na superfície de absorção deste intestino, o que equivaleria a uma superfície de absorção de aproximadamente 200 m2, ou seja, a área de uma quadra de tênis.
Nestas vilosidades intestinais ocorre a absorção dos nutrientes através da parede intestinal para a corrente circulatória. Á medida que as alterações estruturais da doença celíaca se estabelecem nas vilosidades intestinais, com redução significativa da superfície de absorção, o indivíduo acometido por esta enfermidade torna-se desnutrido, não importa quanto alimento ele ingere. Portanto, Doença Celíaca é uma doença caracterizada tanto por uma má absorção intestinal, quanto por reação autoimune anormal desencadeada pelo glúten. Tem um componente genético importante, e algumas vezes a doença se manifesta ou é desencadeada pela primeira vez após uma cirurgia, gravidez, infecção viral ou estresse emocional severo.
Pessoas portadoras de doença Celíaca tem maior probabiliade de apresentarem outras doenças autoimunes, como Diabetes tipo I, doença tiroideana tipo Hashimoto, Artrite reumatóide, Doença de Addison, Sindrome de Sjogren, etc.
É importante enfatizar que os testes clínicos laboratoriais ou a biósia intestinal podem determinar com grande margem de segurança que o indivíduo é portador da doença celíaca, porém um resultado negativo ou inconclusivo destes exames não significa necessariamente que este indivíduo não possua intolerância ou sensibilidade ao glúten. De fato, a maioria das pessoas que apresentam sintomas legitimos e significativos de intolerância ao glúten, não tem testes positivos a ponto de caracterizar como Doença celíaca. Estes indivíduos estão sendo diagnosticados como "Glúten sensitivos não celíacos"(GSNC)

Quais os sintoma que alguém que tem intolerância ou sensibilidade ao glúten pode apresentar?

De fato, a intolerância ao gúten pode se manifestar através de uma miríade de sintomas, muitas vezes vagos e não relacionados ao trato digestivo. O paciente intolerante ao glúten, antes de ter seu diagnóstico estabelecido, frequentemente já "rodou" por um sem número de especialistas, fez inúmeros exames, tomou ou toma diversas medicações (sintomáticas) sem resultados. Então você propõe uma dieta de exclusão "glúten free" e o paciente relata melhora significativa dos seus sintomas. Está então estabelecido o diagnóstico. Veja alguns dos sintomas como a intolerância ao glúten pode se manifestar:
  • Diarréia ou constipação intestinal peródicas
  • Alergias de pele, como dermatites, eczemas; ou respiratórias, como asma ou bronquite asmática.
  • Rinites e sinusites
  • Gases intestinais, distenção e dor abdominal 
  • Refluxo gastroesofágico (Tenho observado pacientes em uso prolongado de medicação antiácida, cuja causa básica dos sintomas é intolerância ao glúten)
  • Dores musculares e articulares (muitos quadros diagnosticados como fibromialgia tem a intolerância ao glúten como pano de fundo)
  • Depressão, Ansiedae, Hiperatividade, Oscilações do Humor
  • Fadiga Crônica inexplicável
  • Cefaléias e enxaquecas
  • Anemias recorrentes com reservas de ferro baixas que não melhoram com a suplementação deste elemento.
  • Atraso de crescimento e baixa estatura.
  • Desequilibrio hormonais (o glúten atua como disruptor endócrino, alterando o delicado equilibrio hormonal)
  • Infertilidade
  • Grande compulsão para comer derivados do trigo
  • Problemas da tiróide (alterações dos hormônios tiroideanos)
  • Etc.
Qual o tratamento para quem tem Doença Celíaca ou Intolerância ao Glúten?

O único tratamento efetivo para a doença celíaca e sintomas relacionados à intolerância ao glúten é uma dieta com restrição de glúten. Para a maioria das pessoas intolerantes ao glúten, seguir uma dieta de exclusão(sem glúten) irá melhorar o estado geral, o dano intestinal e prevenirá a progressão da doença no intestino.Os sinais de melhora usualmente começam a aparecer dias após a exclusão completa do glúten.A recuperação histológica do intestino delgado  usualmente leva de 3 a 6 meses em crianças, porém, pode levar anos em alguns adultos.

Quais as opções de substituição para quem é intolerante ao glúten?

Costumo dizer que a dieta para quem tem doença celíaca ou intolerância ao glúten é bastante simples, mas não é fácil. Por que? A farinha de trigo e seus derivados está profundamente arraizada em nossos hábitos culturais. Experimente passar um dia sem comer pão, biscoito, bolos,cereais, pizza, massas, etc e veja como você se sai. Felizmente existem opções saudáveis e também deliciosas. Apesar das restrições, o indivíduo intolerante ao glúten pode ter uma dieta variada e balanceada. Ele poderá fazer uso de alimentos como as batatas, arroz, feijão,lentilhas, mandioca, soja, quinoa, milho, etc. Em lojas especializadas encontra-se vários produtos de panificação( pães, torradas, bolachas, massas, et.) "sem glúten". Nestes casos estes produtos são feitos da farinha de batata, feijão, etc. Os mineiros, paulistas e goianos também não vão precisar abrir mão do pão de queijo. O polviho não contém glúten.
Pessoas com doença celíaca devem prestar atenção quando tem que comer fora em restaurantes, ou quando vão às compras no supermercado.Comer fora pode se tornar um desafio. Quando em dúvida, melhor consultar o rótulo e verificar os ingredientes daquele alimento ou indagar ao cozinheiro de que é feito aquele prato.
Glúten também é utilizado em alguns medicamentos e também como aditivo em molhos, empanados, e até em produtos inesperados, como batons. Por isso passar a ler os rótulos é fundamental.
Concluindo, se você suspeita que a intolerância ao glúten pode estar contribuindo para prejudicar sua saúde, procure um profissional de saúde de sua confiança para avaliar esta questão. Pessoas que são intolerantes ao glúten também estão mais sujeitas à intolerância ao leite de vaca. A literatura científica relata que um ano após o glúten ser completamente eliminado da dieta, os enterócitos (células intestinais) começam a produzir novamente quantidades adequadas de lactase.Isto precisa ser avaliado. Existe VIDA após o glúten. Com certeza uma vida melhor.

Sugestões para aprofundar-se neste tema:

  1. http://www.celiaccentral.org 
  2. http://www.gluten.net
  3. http://www.livingwithout.com



    domingo, 4 de julho de 2010

    Chocolate: bom ou ruim para o humor?

    A pesquisa científica está comprovando o que o senso comum já havia captado há tempos. As pessoas tendem a comer mais chocolate quando estão se sentindo mais tristes e deprimidas. Pesquisadores da Universidade da Califórnia, Escola de medicina de San Diego, constataram que mulheres e homens comem mais chocolate à medida que aumentam os sintomas de depressão, sugerindo uma associação entre o humor e o chocolate. Este estudo foi publicado no Archives of Internal Medicine, edição de abril.

    O estudo envolveu a participação de 1000 indivíduos que não utilizavam medicação antidepressiva e tinham boa saúde. Os indivíduos estudados registravam quantas porções de chocolate eles consumiam em uma semana, e tiveram seu estado de humor periodicamente avaliado pela Escala de depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos. Os pesquisadores observaram que homens e mulheres que apresentavam os scores mais altos para depressão, consumiaram quase 12 porções de chocolate por mês. Aqueles com scores menores consumiram cerca de 8 porções, e aqueles com os scores mais baixos consumiram 5 porções por mês.

    Segundo Beatrice Golomb, uma das autoras do estudo, os resultados não parecem ser explicados por um aumento geral na ingestão de cafeína, gordura, carboidrato ou de energia, sugerindo que os achados são específicos do chocolate.

    Poderiamos a partir deste estudo concluir que chocolate pode causar depressão? Não! Em pesquisa científica precisamos diferenciar entre associação e causa. O que o trabalho mostra é que existe uma associação entre humor deprimido x comer chocolate.De fato, pode até acontecer o contrário. Se o chocolate ajuda a melhorar o humor, como estudos anteriores tem sugerido, pode ser que aquelas pessoas com sintomas depressivos estejam simplesmente se “automedicando” ao comer chocolate.

    Chocolate e depressão

    Como o chocolate ajuda a melhorar o humor? O chocolate estimula a liberação de neurotransmissores associados à sensação de prazer, incluindo a dopamina e Serotonina. A serotonina cerebral é produzida a partir do aminoácido essencial Triptofano. No entanto, para o triptofano chegar ao cérebro e ser convertido em serotonina, ele precisa atravessar uma barreira anatômica chamada barreira hematoencefálica. Para cruzar a barreira hematoencefálica o triptofano sofre competição com outros aminoácidos neutros e de grande cadeia molecular, como a tirosina, fenilalanina, isoleucina, valina e metionina, o que dificulta bastante a entrada desse triptofano e a sua conversão posterior em serotonina. Quando se come alimento com alto conteúdo de açúcar ou carboidratos simples,por ação da insulina, aumenta a captação periférica destes aminoácidos neutros, diminui a competição a nível de barreira hematoencefálica e aumenta o ingresso de triptofano no cérebro e a sua conversão em serotonina.

    Ora, o chocolate é rico em triptofano e em açúcar, o que justifica ele exercer este incremento temporário no estado de humor. É bom frisar a palavra temporário. Estudo publicado em 2007 no periódico científico Appetite encontrou que comer chocolate melhora o humor durante apenas 3 minutos. A longo prazo os prejuízos causados pela excessiva ingesta de açúcar que espolia magnésio, zinco e outros nutrientes importantes para o organismo pode produzir até um agravamento do quando depressivo. Daí porque os indivíduos “chocólatras” que procuram o chocolate para se sentirem melhor, deverão ser encorajados a implementar mudanças em seu estilo de vida, com atividade física regular, alimentação saudável, gerenciamento do stress,  psicoterapia ou farmacoterapia, quando necessário.
    Além dos seus efeitos no humor, o chocotate também é rico em antioxidantes polifenólicos (semelhantes aos do chá verde) com efeitos benéficos no sistema cardiovascular e outros orgãos.

    Fonte:

    1.Natalie Rose; Sabrina Koperski; Beatrice A. Golomb. Mood Food: Chocolate and Depressive Symptoms in a Cross-sectional Analysis. Arch Intern Med, 2010; 170 (8): 699-703