domingo, 10 de outubro de 2010

Restringir calorias para viver mais: estamos descobrindo a verdadeira fonte da juventude?


Nas últimas décadas temos presenciado um crescimento vertiginoso na produção científica relacionada ao envelhecimento humano e estratégias biológicas possíveis para retardá-lo. Tanto que, em países desenvolvidos como os Estados Unidos, novas áreas de atuação e pesquisa tem surgido (“antiaging medicine”) ocupando-se em extender ao máximo a longevidade humana, que, segundo boas fontes de pesquisa, estaria geneticamente programado para alcançar perfeitamente seus 120 anos.  Enquanto muitas estratégias estão sendo discutidas e defendidas por cientistas e médicos com esta finalidade, tais como modulação hormonal, uso de antioxidantes, medicamentos, nutrientes, etc, até o presente momento, a única estratégia bem documentada e cientificamente comprovada, tanto na espécie humana quanto nas demais espécies como roedores, invertebrados  e mamíferos, é a restrição calórica com nutrição ótima.  Deste modo, a longevidade do ser humano não dependeria  apenas do QUE ele come, mas principalmente de QUANTO ele come.
Estudos tem mostrado que a restrição calórica acompanhada por nutrição ótima pode extender a vida média de animais em 30 a 230%, dependendo da espécie observada. Nos EUA, o National institute on aging(NIA), a Universidade de Winsconsin e a Universidade de Maryland estão no momento conduzindo estudos sobre os efeitos da restrição calórica em primatas. Resultados definitivos  estarão disponíveis ainda este ano.  Preliminarmente, no estudo do NIA, o número de mortes no grupo da restrição calórica é aproximadamente a metade do observado no grupo sem restrição calórica.
Embora estudos sobre os efeitos da restrição calórica em humanos nunca tenham sido conduzidos, há evidências que sugerem que os benefícios da restrição calórica com nutrição ótima também podem funcionar em humanos, como nas outras espécies. Por exemplo, a ilha de Okinawa no Japão é um dos lugares do mundo com maior concentração de idosos. Okinawa tem cerca de 40 vezes mais centenários que o resto do Japão.A ingesta calórica de um adulto de Okinawa é 20% mais baixa que em outros lugares do Japão. As crianças de Okinawa consomem apenas 60% do total de calorias consumidas por seus pares japoneses. A longevidade deste grupo pode muito bem estar relacionada a dieta com restrição calórica, embora outros fatores também possam estar relacionados.
Adicionalmente, dados do “Baltimore Longitudinal Study on Aging” sugerem que humanos longevos exibem várias características fisiológicas e bioquímicas também observadas em animais sob restrição calórica: menores valores de temperatura corporal, níveis mais baixos de insulina circulante, menores níveis do hormônio tiroideano T3 e níveis mais altos do hormônio DHEA (possivelmente um marcador de longevidade) no sangue.

Como a restrição calorica parece interferir na longevidade e na saúde.

A evidência científica mais relevante atribui boa parte dos efeitos benéficos da restrição calórica com nutrição ótima à redução nos níveis de glicose e insulina na circulação e conseqüente melhora da sensibilidade à insulina. A maioria das pessoas hoje está comendo bem mais (calorias) do que necessita para manter um nível ótimo de saúde.
Nossa genética (que não é diferente da dos nossos ancestrais que viviam em cavernas) é toda adaptada para aproveitar ao máximo o alimento disponível e armazenar o excedente em forma de gordura. O estabelecimento da agricultura há 10000 passou a ditar a forma das pessoas se alimentarem. Grãos ricos em carboidratos tornaram-se disponíveis em grandes quantidades. Logo, as farinhas refinadas destes grão(que promovem rápidos aumentos nos níveis circulantes de glicose e insulina) também passaram a representar uma das principais fontes de calorias da dieta do homem moderno. Este desajuste entre a nossa programação genética e o estilo de vida moderno explica porque a sociedade esta cada vez mais gorda e mais enferma. A escalada das chamadas doenças crônicas degenerativas (hipertensão artéria, diabetes, obesidade, câncer, doença cardiovascular, etc) tem sido o resultado natural do aumento de consumo de calorias, principalmente às custas de “calorias vazias”, ou seja de pobre conteúdo nutricional, e da redução do nível de atividade física da população. Ora, se prestarmos atenção, observamos que estas doenças crônicas são características do processo de envelhecimento. Apontam para o fato de que o excesso de calorias acelera os processos biológicos de envelhecimento celular. Os estudos de restrição calórica em animais indicam redução significativa de todos os fatores de risco para estas doenças, além do prolongamento do tempo de vida.
Outros mecanismos relacionados à eficácia da restrição calórica em promover maior longevidade estão relacionados com a redução do metabolismo, redução na formação de radicais livres e do dano celular provocado por eles, redução da inflamação endógena e potencialização dos processos de reparo celular e de DNA.
 
Cabe aqui um esclarecimento necessário. A restrição calórica que trás como resultado a extensão da vida, é a RESTRIÇÃO CALÓRICA COM NUTRIÇÃO ÓTIMA, ou seja, através de uma dieta balanceada que não restringe o aporte de nenhum nutriente importante para a manutenção da saúde. Em post anterior, expliquei aqui como os pequenos desequilíbrios diários na ingestão de calorias é que determinam o ganho de peso observado a medida que o tempo passa. A conta é mais ou menos assim: 50 calorias por dia a mais do que se gasta, irão acarretar um ganho de aproximadamente 2kg ao final de 1 ano. Embora nem todos necessitem reduzir 30% do total de calorias consumidas, que é a quantidade de redução em que os estudos observam aumento da longevidade, a grande maioria vai se beneficiar grandemente de reduções mais modestas, com efeitos positivos sobre o ganho de peso e redução de risco de doenças crônico degenerativas.


FONTES:

1.  JMcCay CM, Crowell MF, Maynard LA. The effect of retarded growth upon the length of life span and upon the ultimate body size. Journal of Nutrition 1935, 10:63-79. 


2.  Weindruch R, Walford RL., "Dietary restriction in mice beginning at 1 year of age: effect on life-span and spontaneous cancer incidence." Science, March 12, 1982; 215(4538), pages 1415-8. PMID: 7063854


3.  Roy Walford, M.D., "Beyond the 120 Year Diet: How to Double Your Vital Years ", 2000. 


4.  Mattson, et al. "Intermittent fasting dissociates beneficial effects of dietary restriction on glucose metabolism and neuronal resistance to injury from calorie intake, Proc Natl Acad Sci USA, 2003 May 13; 100(10):6216-6220. 


5.  E J Masoro, et al, "Action of food restriction in delaying the aging process", Proc Natl Acad Sci U S A., 1982 July; 79(13): 4239-4241. 


6.  Ross MH., Length of life and caloric intake. Am J Clin Nutr. 1972 Aug;25(8):834-8. 


7.  Bodkin NL, Alexander TM, Ortmeyer HK, Johnson E, Hansen BC. Mortality and morbidity in laboratory-maintained Rhesus monkeys and effects of long-term dietary restriction. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2003 Mar;58(3):212-9. PMID: 12634286


8.  Keys A, Brozek J, Henschel A, Mickelsen O, Taylor HL. "The biology of human starvation", Minneapolis: University of Minneapolis Press, 1950. 


9.  Kalm LM, Semba RD, "They starved so that others be better fed: remembering Ancel Keys and the Minnesota experiment", J Nutr. 2005 Jun; 135(6):1347-52. PMID: 15930436 


10.  Welle SL, Seaton TB, Campbell RG. "Some metabolic effects of overeating in man", Am J Clin Nutr. 1986 Dec;44(6):718-24. PMID: 3538842

Um comentário:

  1. http://neuropapers.com/categorias/journal-club/146-restricao-calorica-e-longevidade.html

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